terça-feira, 16 de abril de 2013

Teatro/CRÍTICA


"Aos domingos"


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Amargo e revelador reencontro


Lionel Fischer



Os irmãos Ana e Edu sempre se gostaram e provavelmente foram muito unidos na infância, sobretudo depois que seu pai saiu de casa e foi viver com outra mulher, prometendo voltar aos domingos para visitá-los - promessa nem sempre cumprida. Já adultos, Edu vai embora e Ana fica cuidando da mãe até sua morte. Seis anos se passaram. Ana está casada com Sérgio e Edu aparentemente não se ligou a ninguém. Estamos num domingo e um almoço foi preparado para celebrar o reencontro entre os irmãos. Para surpresa de Ana, João, por quem fora apaixonada, também aparece. 

Eis, em resumo, o enredo de "Aos domingos", de autoria de Julia Spadaccini, em cartaz no Teatro Glaucio Gill. Bruce Gomlevsky assina a direção da montagem, estando o elenco formado por Juliana Teixeira (Ana), Jorge Caetano (Edu), Bruno Padilha (João) e Paulo Giardini (Sérgio).   

Como se sabe, todo reencontro possui um dado de tensão - as pessoas podem ter mudado, os sentimentos já não serem os mesmos, havendo também a possibilidade de aflorarem mágoas e queixas até então jamais explicitadas. No presente caso, o amor que sempre uniu os irmãos permanece o mesmo, mas certamente algumas contas precisam ser pagas ou ao menos equacionadas. Esclarecimentos se impõem e pouco a pouco vamos conhecendo tudo que aconteceu aos irmãos no período em que não se viram. E através do que revelam (que obviamente não posso aqui explicitar), penetramos em um universo bem mais amargo do que feliz.

Muito bem escrito, contendo bons personagens e diálogos fluentes, ainda assim acredito que a autora, diante de um material tão rico, poderia ter se aprofundado ainda mais em determinados conflitos. E não apenas entre os irmãos, mas também nos que envolvem a relação entre Ana e João e a deste com Edu. Sei que Julia Spadaccini pretendeu escrever uma peça de uma hora, mas certamente teria capacidade de estendê-la um pouco mais sem por isso torná-la menos interessante do que já é.

Com relação ao espetáculo, Bruce Gomlevsky impõe à cena uma dinâmica adequada ao material dramatúrgico, ou seja, centrada no jogo entre os atores. Mas me parece que poderia, por exemplo, ter encontrado um maior número de variações rítmicas, que possivelmente contribuiriam para enfatizar ainda mais os múltiplos climas emocionais em jogo. E também acredito que a movimentação do elenco poderia ser mais moderada, ao menos nas passagens mais dramáticas, quando os personagens se enfrentam, olho no olho.

Na pele da atormentada Ana, Juliana Teixeira exibe atuação forte e emocionada, mas certamente ainda poderá encontrar variantes que não a levem, por exemplo, a proferir o texto com excessiva  velocidade quando sua personagem está à beira do descontrole - sendo talentosa como é, a atriz sabe perfeitamente que qualquer descontrole também pode ser expresso de forma contida ou entrecortada, o que não raro o valoriza.

Vivendo Edu, Jorge Caetano, a exemplo de Juliana, também exibe performance convincente, mas me permito sugerir ao ator que, em seu grande monólogo, não priorize apenas a dor, pois isso o leva a adotar um tom excessivamente choroso, quando poderia mesclá-lo à amorosa raiva que sente pela irmã nesta passagem, na qual objetiva fundamentalmente alertá-la sobre uma série de pontos que ela prefere ignorar. Bruno Padilha (João) compõe seu personagem com a elegância e sobriedade a ele inerentes, com Paulo Giardini dando um show vivendo o cínico e debochado Sérgio, marido de Ana - e aqui cabe ressaltar a capacidade do ator de valoriozar ao máximo um papel curtíssimo.

Na equipe técnica, não entendi a proposta cenográfica de Nello Marrese e Natalia Lana, sobretudo no que concerne ao imenso pano que sugere um varal - se a ideia era transmitir a decadência do lugar, o recurso me pareceu insatisfatório. A mesma insatisfação senti com relação aos figurinos de Flavio Souza, que não definem com clareza a condição social e a personalidade dos personagens. Luiz Paulo Nenén responde por iluminação correta, a mesma correção presente na trilha sonora assinada pelo diretor.

AOS DOMINGOS - Texto de Julia Spadaccini. Direção de Bruce Gomlevsky. Com Juliana Teixeira, Jorge Caetano, Bruno Padilha e Paulo Giardini. Teatro Glaucio Gill. Sexta, sábado e segunda, 21h. Domingo, 20h.








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