sexta-feira, 22 de fevereiro de 2013

Teatro/CRÍTICA

"Porcos asas - A descoberta da sexualidade"

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Afetos, carências e desejos


Lionel Fischer


O presente espetáculo participou com sucesso da última edição da FITA (Festa Internacional de Teatro de Angra), recebendo várias indicações e contemplado com os prêmios de Melhor Espetáculo (direção de Cláudio Handrey), Melhor Ator Coadjuvante (Iuri Kruschewsky) e Melhor Atriz Coadjuvante (Patrícia Ramalho). Agora, passados dois meses, a montagem acaba de estrear no Espaço Sesc, e tudo indica que tenha aqui a mesma e calorosa acolhida que teve em Angra.

Inspirada no livro "Porci com le ali - diario sessuo-politico di due adolescenti", de Marco Radice e Lidia Ravera, lançado no Brasil em 1981, "Porcos com asas - A descoberta da sexualide" leva a assinatura de Mário Sérgio Medeiros e tem direção a cargo de Claudio Handrey. No elenco, Andressa Lameu, Rafael Canedo, Patrícia Ramalho, Iuri Kruschewsky, Julianne Trevisol, Carlos Veranai, Manoel Madeira e Gabriella Cavalcanti.

Tendo como tema central, como indica o título, a descoberta da sexualidade, o texto também aborda várias outras questões, tais como a amizade, relações familiares e, em especial, a extrema dificuldade de se mesclar afeto e desejo, que, em minha opinião, permanece inalterada desde Adão e Eva, independentemente de todas as mudanças comportamentais surgidas desde então. 

Antônia e Rocco têm 17 anos. Ela talvez seja mais amadurecida do que ele, se levarmos em conta apenas a facilidade com que se entrega fisicamente aos seus namorados. Mas trata-se, naturalmente, de uma aparência, pois quando começa a se relacionar com Rocco e ele praticamente só deseja levá-la para a cama, Antônia evidencia sua enorme carência afetiva. Obviamente que o jovem não entende, pois acredita que o fato de desejá-la tanto equivale a uma tácita demonstração de seu amor.

E outros tantos não-entendimentos ficam evidenciados: a homossexualidade é saudável ou não passa de uma transgressão? Masturbar-se pode gerar prazer ou tão somente culpa? É possível uma real escuta entre mãe e filha, se ambas se dispuserem a afrouxar suas defesas, o que possibilitaria ao menos uma trégua nos habituais e dolorosos confrontos? A tais perguntas o texto não faculta uma resposta clara, mas é evidente que o autor ao menos sugere que qualquer encontro, seja qual for sua natureza, pressupõe uma sincera avaliação entre as partes, estando aí incluída, naturalmente, a aceitação das mútuas fragilidades.

Bem escrito, contendo ótimos personagens e reflexões mais do que pertinentes sobre os temas abordados, "Porcos com asas" recebeu criativa e séria versão cênica de Claudio Handrey, cabendo destacar a precisão e originalidade da maioria das marcações, assim como a delicadeza com que trabalhou as cenas de nudez - naquela em que Rocco e Antônia fazem amor, à distância, e ao mesmo tempo comentam o que estão sentindo, a direção consegue obter total cumplicidade da plateia, que em nenhum momento me pareceu particularmente focada na beleza física dos protagonistas e sim nas questões que explicitam.

Na pele de Antônia, Andressa Lameu exibe excelente performance, entregando-se por completo à conflitada personagem que encarna - acho apenas que a atriz, por sinal possuidora de ótima voz, em algumas passagens poderia falar mais devagar, pois algumas palavras se perdem. A mesma eficiência se faz presente no desempenho de Rafael Canedo (Rocco), sobretudo nos momentos em que trabalha a fragilidade do personagem, a ela impondo um comovente grau de sinceridade. Patrícia Ramalho está engraçadíssima na pele da mãe histérica e desvairada, mas também consegue valorizar muito bem a cena final com a filha, onde aflora uma amargura até então oculta. Iuri Kruschewsky também arranca muitas gargalhadas da plateia vivendo Roberto, o melhor amigo de Rocco.

Em papéis de menores oportunidades, merecem ser considerados seguros e convincentes os desempenhos de Julianne Trevisol (Lisa e Ana), Carlos Veranai (Professor Marcelo e Ele), Manoel Madeira (Gianne) e Gabriella Cavalcanti (Laura).

Na equipe técnica, Zanini de Zanine responde por despojada e expressiva cenografia, a mesma expressividade presente na iluminação de Leysa Vidal, nos figurinos de Felipe Ferraz e na trilha sonora assinada pelo diretor.

PORCOS COM ASAS - a DESCOBERTA DA SEXUALIDADE - Texto de Mário Sérgio Medeiros. Direção de Claudio Handrey. Com Andressa Lameu, Rafael Canedo, Patrícia Ramalho, Iuri Kruschewsky, Julianne Trevisol, Carlos Veranai, Manoel Madeira e Gabriella Cavalcanti. Espaço Sesc. Quinta a sábado, 20h30. Domingo, 18h30.










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