quarta-feira, 30 de maio de 2012

Teatro/CRÍTICA

"Não sobre rouxinóis"

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Ótima montagem inaugura teatro

 

Lionel Fischer


Um dos maiores representantes do drama psicológico-realista dos Estados Unidos dos anos 40 e 50, Tennessee Williams (1911-1983) foi claramente influenciado por O'Neill, Ibsen e Strindberg. Após escrever algumas peças que não obtiveram maior repercussão, estreou o grande sucesso "O zoológico de cristal", considerada uma de suas melhores obras, na qual aparecem seus temas prediletos: o choque entre a realidade e a ilusão, a frustração, a solidão e a fragilidade humana. Mais adiante, produziu outras peças notáveis, como "Um bonde chamado desejo", "A rosa tatuada", "Gata em teto de zinco quente", "O doce pássaro da juventude" e "A noite do iguana".

Curiosamente, a presente empreitada traz para o palco uma peça que, embora escrita em 1938, só seria apresentada pela primeira vez - e na Inglaterra! - em 1998, graças à iniciativa da atriz Vanessa Redgrave. Qual seria a razão deste bizarro esquecimento? Dizem os sábios que um texto de autor consagrado, quando jamais é montado, é porque não é bom. Mas os sábios costumam cometer enganos com espantosa freqüência, como ocorre com "Não sobre rouxinóis", que acaba de inaugurar o Theatro Net Rio.

Com tradução assinada por Eduardo Rieche e direção a cargo de João Fonseca e Vinícius Arneiro, a montagem chega à cena com elenco formado por Nilvan Santos, Adriana Maia, Júlia Marini, Eduardo Rieche, Thelmo Fernandes, Cleiton Rasga, Éber Inácio, Alexandre Mofati, Sérgio Ricardo Loureiro, Alex Nader e César Amorim.

Escrita a partir de um fato real, o texto de Williams gira em torno das atrocidades perpetradas contra os detentos de uma penitenciária, o que finalmente os leva a fazer uma greve de fome, daí resultando  trágicas conseqüências. Contendo ótimos personagens, diálogos fluentes e uma ação que prende a atenção do espectador desde o início, "Não sobre rouxinóis" é um vigoroso libelo contra o sistema carcerário, cuja função seria a de reabilitar os condenados, mas na prática - desde sempre, em todos os países e seja qual for o regime - nada mais faz do que torná-los indivíduos incapazes de voltar a conviver com a sociedade que os excluiu.

Impondo à cena uma dinâmica que, ao priorizar o realismo, contribui decisivamente para acentuar os tenebrosos conflitos em jogo, João Fonseca e Vinícius Armeiro materializaram uma montagem de extrema crueza, não raro claustrofóbica, que obriga o espectador não tanto a identificar-se com os dramas vividos pelos personagens, mas a refletir sobre os horrores de uma instituição que parece fadada a se perpetuar, ainda que todos saibamos que este "modelo" de re-educação já nasceu falido.

Quanto ao elenco, em função do grande número de atores, torna-se literalmente impossível fazer uma análise detalhada de cada atuação. Ainda assim, seria por demais injusto não me deter ao menos em duas performances: a de Eduardo Rieche e a de Thelmo Fernandes. O primeiro, na pele de "Canário" Jim, consegue traduzir, de forma sensível e comovente, a exasperante dualidade de um personagem que, para encurtar sua pena, resolve colaborar com o diretor do presídio na qualidade de alcagüete. 

Com relação a Thelmo Fernandes, trata-se de um ator que, por razões que a razão desconhece, ainda não obteve o reconhecimento que de há muito merece. Mas espero que esta realidade possa mudar a partir de agora, pois sua atuação como Chefe Whalen, diretor do presídio, é simplesmente magnífica - o ator consegue valorizar tanto a extrema violência e intolerância do personagem quanto a ternura que sente por sua filha, o que evidencia sua incontestável psicopatia. Sem dúvida, um desempenho que se insere entre os melhores da atual temporada.

Mas é óbvio que o impacto desta mais do que oportuna montagem também está atrelado ao seguro desempenho de todos os profissionais que estão em cena. Assim, parabenizo com grande entusiasmo as atuações de Adriana Maia (Sra. Bristol), Nilvan Santos (Guia do Lorelei/Reverendo Hooker), Júlia Marini (Eva Crane), Cleiton Rasga (Schultz), Bruno Ferrari (Butch), Éber Inácio (Queen), Alexandre Mofati (Joe), Sérgio Ricardo Loureiro (Oliver), Alex Nader (Swifty) e César Amorim (Capelão).

Na equipe técnica, Nello Marrese e Natália Lana assinam uma cenografia altamente expressiva, cabendo destacar a alusão feita a câmaras de gás. Igualmente irrepreensíveis os figurinos de Mauro Leite, a iluminação de Dani Sanchez, o visagismo de Uirandê Holanda e a tradução de Eduardo Rieche.

NÃO SOBRE ROUXINÓIS - Texto de Tennessee Williams. Direção de João Fonseca e Vinícius Arneiro. Com Eduardo Rieche, Thelmo fernandes e grande elenco. Theatro Net Rio. Quinta, sexta, sábado e segunda, 19h. Domingo, 18h

  
1º CENA BRASIL INTERNACIONAL ACONTECE ENTRE OS DIAS 1º E 11 DE JUNHO NO RIO


Evento apresenta 23 espetáculos de teatro nacionais e internacionais, e promove intercâmbio com os festivais de Avignon e Edimburgo


          O Rio de Janeiro voltará a sediar um grande festival de teatro. Entre os dias 1º e 11 de junho, o Cena Brasil Internacional ocupará quatro espaços no Centro da cidade: Centro Cultural Banco do Brasil, Praça dos Correios, Casa França-Brasil e o restaurante Cais do Oriente, que será palco de uma apresentação da companhia escocesa National Theatre of Scotland. Peças de rua também serão encenadas no entorno desse pólo cultural. Idealizado pelo produtor Sérgio Saboya, o festival apresentará 23 espetáculos – 14 nacionais e nove estrangeiros – sendo 17 inéditos no Rio. Entre os nacionais, dois farão aqui suas estreias: “Histórias de Família”, do Amok Teatro, e “A Marca da Água”, do Armazém Companhia de Teatro.


          Com patrocínio do Centro Cultural Banco do Brasil Rio de Janeiro, Centro Cultural Banco do Brasil São Paulo, Correios, Prefeitura de Lorena e Governo do Estado de São Paulo, o festival terá desdobramento em Lorena (13 a 17/06), no Vale do Paraíba, e São Paulo (13 a 24/06). No Rio, a expectativa da organização é receber 60 mil pessoas em onze dias de evento. Todos os espetáculos terão preços populares, a R$ 3,00 (meia) e R$ 6,00 (inteira), ou entrada franca. Cada grupo fará pelo menos duas apresentações no Rio e em São Paulo, além de ministrar uma oficina com os artistas das outras companhias e com o público em geral. Em São Paulo, a programação terá um formato reduzido, com quatro grupos estrangeiros e quatro nacionais que não participarão da residência no Rio.


          “O projeto pretende promover o intercâmbio entre artistas brasileiros e estrangeiros e aproximar os grupos de teatro nacionais dos festivais fora do Brasil”, diz Sérgio Saboya. Brasileiros e estrangeiros ficarão reunidos durante os 11 dias de evento no Rio, em residência. Todos farão workshops e demonstrações de seus processos criativos e artísticos. Para que o conceito de residência seja plenamente vivenciado e para que resulte em um consistente intercâmbio cultural, todos os grupos participarão de todas as oficinas, que serão abertas ao público.


          O Cena Brasil Internacional também vai promover um tratado inédito de cooperação com dois dos mais relevantes festivais de teatro do mundo, o de Avignon, na França, e o de Edimburgo, na Escócia: seis produções nacionais das residências artísticas (quatro do Rio e duas de São Paulo) serão selecionadas para apresentações nos festivais de Avignon (França) e Edimburgo (Escócia). Esta proposta tem o propósito de realizar uma “Mostra Teatral Brasileira” dentro das duas feiras de cultura em 2013. A curadoria nacional e internacional é do crítico de teatro, diretor e ator Celso Curi e da produtora Dane de Jade.


A PROGRAMAÇÃO INTERNACIONAL


          O Cena Brasil Internacional selecionou oito grupos (nove espetáculos) internacionais de sete países da Europa e da América do Sul. Com mais de 30 anos de estrada, os premiados artistas espanhóis da La Zaranda apresentam “Ninguém Quer Acreditar” (Nadie lo Quiere Creer). Comandada por Jean-Michel d’Hoop na Bélgica, Point Zero traz duas montagens: "Três Velhas” (Trois Vieilles) e “A Escola de Ventríloquos” (L'École des Ventriloques). Criada em Leeds, na Inglaterra, Imitating The Dog reúne em suas montagens mídias digitais, design e performances físicas. No festival, a companhia mostra “Hotel Methuselah” (Hotel Methuselah).


          Com mais de 35 espetáculos no repertório e a tradição de usar marionetes em suas criações, o Teatro Marionetas do Porto, Portugal, traz a peça “Frágil” (Frágil). A companhia escocesa National Theatre of Scotland que tem como premissa levar o teatro para bares e lugares pouco improváveis, como acontece em “A Estranha Desfeita de Prudencia Hart” (The Strange Undoing of Prudencia Hart), que no Rio ganhou como palco o restaurante Cais do Oriente.


          Da Colômbia, a Cia Varasanta traz uma versão do clássico “A Tempestade” (La Tempestad), de William Shakespeare. O festival traz a atriz cubana Merida Urquia; na Cia também colombiana, Ensamblaje apresentando o monólogo “A Pantera de Judeia” (La Pantera de Judea). Criado na década de 1980, o grupo chileno Teatro Cinema propõe uma fusão de teatro e cinema em suas apresentações, como na montagem “Sem Sangue” (Sin Sangre), que trata de temas como assassinato e vingança.


A PROGRAMAÇÃO NACIONAL


          As oito companhias brasileiras selecionadas para residência apresentam cinco espetáculos inéditos no Rio de Janeiro e duas estreias nacionais. O grupo Amok Teatro encerra a “Trilogia da Guerra” com a montagem inédita “Histórias de Família”, baseada em texto da dramaturga sérvia Biljana Srbljanovic sobre a guerra, a partir do olhar de sua infância. A outra estreia nacional é do Armazém Companhia de Teatro (Rio de Janeiro). Em “A Marca da Água”, o grupo carioca reafirma questões presentes no trabalho da companhia, como a dramaturgia do tempo, a questão da memória e o olhar poético sobre a existência.


          Mais recente espetáculo da Cia Teatro Balagan (São Paulo), “Prometheus – A Tragédia do Fogo” relata o mito de Prometeu, titã que modela o homem no barro e que lhe dá o fogo, depois de tê-lo roubado dos deuses. Em poder do fogo, o homem passa a dominar a natureza e toma consciência de sua condição. O espetáculo oferece fragmentos da narrativa, pistas do mito, que cabem ao espectador organizar – dependendo de onde ele se encontra no espaço da encenação – a fim de apresentar múltiplas perspectivas do mito prometéico.


          O monólogo “Boi” foi escrito pelo dramaturgo Miguel Jorge especialmente para o ator goiano Guido Campos Correa. A peça parte de uma bucólica situação inicial, para aprofundar-se na relação de amizade entre Zé Argemiro e o boi Dourado. O grupo Teatro Máquina (Fortaleza) traz uma adaptação do texto “Ivanov”, escrito por Anton Tchékhov em 1897. Em cena, a história de um homem ensimesmado com seus conflitos interiores. Exposto ao amor da esposa doente e à paixão fulminante da jovem Sasha.


          A companhia Vigor Mortis (Curitiba) foi criada em 1997 por Paulo Biscaia Filho como um espaço para experimentar as possibilidades estéticas motivadas pelo Grand Guignol, o teatro de horror de Paris. No festival, o público confere “À Meia Noite Levarei o Teu Cadáver”, que explora universo do “mestre do horror” Zé do Caixão, unindo linguagens de cinema e teatro em um espetáculo perturbador e aterrorizante. Sozinho em cena, o ator Leandro Daniel Colombo contracena com vários personagens em projeções (interpretados por atores em um vídeo).


          A instalação multimídia “Corpo Lixo da Alma” é uma criação do cenógrafo e figurinista Mauricio Carneiro e da atriz Beo da Silva (Londres e Rio de Janeiro). O projeto combina performance, poesia, vídeo, música e fotografia com o objetivo de provocar um diálogo com o espectador em relação ao lixo produzido pela sociedade.


          Uma das companhias de teatro de bonecos mais atuantes no país, Caixa do Elefante Teatro de Bonecos (Porto Alegre) apresenta a montagem Com dramaturgia visual e direção assinada por Paulo Balardim, o espetáculo é inspirado em alguns mitos que envolvem a tecelagem. A tecelã tem o poder de transformar seus desejos em realidade e vencer a solidão de seus dias.


          A programação nacional também contempla sete espetáculos que fazem parte da Mostra Rio: “Chegança do Almirante Negro” (Grande Companhia Brasileira de Mystérios e Novidades), “Felinda” (Cia. Carroça de Mamulengos), “Flor de Macambira” (Ser Tão Teatro) e “Roda Saia Gira Vida” (Teatro de Anônimo). Essas quatro produções serão apresentadas ao ar livre, na Travessa Tocantins, que fica atrás do Centro Cultural Banco do Brasil. Ainda como parte da Mostra Rio, as montagens “A Tecelã” (Caixa do Elefante Teatro de Bonecos), “Hysteria” (Grupo XIX) e “Isso Te Interessa?” (Companhia Brasileira de Teatro) serão apresentadas no CCBB.



OS ESPETÁCULOS INTERNACIONAIS


A Escola de Ventríloquos (L'École des Ventriloques) / Point Zero – Bélgica


A Estranha Desfeita de Prudencia Hart (The Strange Undoing of Prudencia Hart) / National Theatre of Scotland – Escócia


Frágil (Frágil) / Teatro Marionetas do Porto – Portugal


A Pantera de Judeia (La Pantera de Judea) / Ensamblaje – Colômbia


A Tempestade (La Tempestad) / Varasanta – Colômbia


Hotel Methuselah (Hotel Methuselah) / Imitating The Dog – Inglaterra


Ninguém Quer Acreditar (Nadie lo Quiere Creer) / La Zaranda – Espanha


Sem Sangue (Sin Sangre) / Teatro Cinema – Chile


Três Velhas (Trois Vieilles) / Point Zero – Bélgica



OS ESPETÁCULOS NACIONAIS


A Marca da Água – Armazém Companhia de Teatro (Rio de Janeiro)


À Meia Noite Levarei o Teu Cadáver – Vigor Mortis (Curitiba)


Boi – Guido Campos Correa (Goiás)


Corpo Lixo da Alma – Mauricio Carneiro e Beo da Silva (Londres e Rio de Janeiro)


Histórias de Família – Amok Teatro (Rio de Janeiro)


Ivanov – Teatro Máquina (Fortaleza)


Prometheus – A Tragédia do Fogo – Cia Teatro Balagan (São Paulo)



OS ESPETÁCULOS DA MOSTRA RIO


A Tecelã – Caixa do Elefante Teatro de Bonecos (Porto Alegre)


Chegança do Almirante Negro – Grande Companhia Brasileira de Mystérios e Novidades (Rio de Janeiro)


Felinda – Cia. Carroça de Mamulengos (Brasília)


Flor de Macambira – Ser Tão Teatro (João Pessoa)


Hysteria – Grupo XIX (São Paulo)


Isso Te Interessa? – Companhia Brasileira de Teatro (Curitiba)


Roda Saia Gira Vida – Teatro de Anônimo (Rio de Janeiro)




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terça-feira, 29 de maio de 2012

Cia Atores de Laura completa 20 anos com Mostra reunindo cinco sucessos de sua trajetória



Números confirmam a consolidação do grupo:


- 70.100 horas em cena;


- 6.400 horas em ensaios;


- Público aproximado de 700 mil pessoas assistiram aos 19 espetáculos da Cia;


- 22 Prêmios teatrais recebidos (como os Prêmios Shell e APTR para o sucesso “O Filho Eterno”, em 2011) e mais de 30 indicações ao longo dos 20 anos;


- Percorreram cerca de 38 cidades;




Mostra– Atores de Laura 20 anos




           O momento é de comemoração para um dos grupos teatrais mais respeitados no Brasil. A Cia Atores de Laura, que completa 20 anos em 2012, vai celebrar a data reunindo cinco espetáculos do seu repertório na Mostra – Atores de Laura 20 Anos, que vai acontecer entre os dias 07 de junho e 29 de julho na Casa de Cultura Laura Alvim, em Ipanema, no Rio de Janeiro. O local para a comemoração, onde também vai acontecer uma exposição de fotos, relembrando os 20 anos da Cia, não foi escolhido aleatoriamente, já que foi ali, no ano de 1992 que tudo começou.


          Foi na Casa de Cultura Laura Alvim que seus integrantes se encontraram. O nome da Cia nasce em homenagem à artista carioca que tanto contribuiu para a cultura do Estado. Laura conseguiu transformar a sua casa em Ipanema num centro cultural, um dos mais bem localizados que temos hoje em nossa cidade, na Avenida Vieira Souto. Sempre foi apaixonada pelo teatro, mesmo nunca tendo tido coragem de seguir sua vontade: o maior sonho de Laura era ser atriz, mas foi contrariada pela família. Com a morte dos pais, Laura passou por momentos financeiros difíceis mas não a ponto de fazê-la desistir de seu sonho, mesmo após receber propostas milionárias pela casa. Em 1983, prova sua sanidade mental, e em perfeitas condições, doa a casa para o Estado para ser utilizada para o fim que sempre sonhou.


          Inicialmente fundada e dirigida por Daniel Herz e Susanna Kruger, a Cia Atores de Laura passou, a partir de junho de 2009, a ser constituída por atores reunidos numa cooperativa junto ao diretor Daniel Herz. Os Atores de Laura dedicaram-se desde logo ao trabalho coletivo, com o objetivo de pensar e realizar o ator como força principal do jogo cênico, em torno do qual são construídas, paralela e posteriormente, a direção, a cenografia, a vestimenta e a iluminação. Foi criada no Rio de Janeiro em 1992 e desde então vem se apresentando em várias cidades do Brasil e no exterior (festivais em Lyon, na França e em Córdoba, na Argentina. Tem no seu repertório 19 montagens teatrais – sendo duas para crianças (A casa bem-assombrada, 1998, e a premiada A flauta mágica, 1999).


          Consideram o ator como o elemento principal, o agregador e motivo maior da realização dos seus espetáculos, o que se tornou a marca distintiva de seu modo de criação e de produção artística até hoje. Essa opção de trabalho, o empenho em aperfeiçoar constantemente a formação artística de seus integrantes, a sintonia com a renovação da linguagem cênica do teatro contemporâneo, exigência com a qualidade artística dos textos selecionados, e a preocupação com a educação dos jovens e a formação de plateias, certamente são as características que renderam aos Atores de Laura os 19 prêmios de teatro com que foram agraciados seus artistas ao longo da trajetória da companhia, o reconhecimento do público, da crítica especializada e do meio artístico – e, mais importante que tudo, a possibilidade de estar no palco com continuidade e alegria por quase 20 anos.


          No ano 2000, foram convidados para administrar o Teatro Miguel Falabella, no NorteShopping – um dos maiores (453 lugares) e mais bem equipados teatros da cidade. Na sua sede, os Atores de Laura têm a oportunidade de proporcionar cursos de teatro, formar plateia e oferecer um espaço de experimentação para grupos e Cias. na Sala Atores de Laura, um espaço alternativo, fundado pela Cia. dentro do Teatro Miguel Falabella.


          Os números comemorativos mostram que é mais do que o momento de celebrar:


          Os atores da cia estiveram em cena por cerca de 70.100 horas. Passaram cerca de 6.400 horas em ensaios. Encenaram 19 espetáculos, somando um público aproximado de 700 mil pessoas. Percorreram por volta de 38 cidades. Conquistaram 22 Prêmios teatrais e receberam mais de 30 indicações.


          A comemoração com a Mostra vai reunir ainda alguns convidados especiais no espetáculo Decote: Clarissa Kahane, Carol Santorino, Eduardo Landin, Gabriela Rosas, Juliana Didone e Thiago Mello.


Sobre Daniel Herz (diretor da Cia):


          Daniel Herz é ator, diretor teatral, autor e diretor artístico da Companhia de Teatro Atores de Laura.


          Seu primeiro trabalho como ator profissional foi em “Doente imaginário”, de Molière, em 1984. Desde então atuou em diversas montagens como: “Graffite coração”, de Bernardo Horta; “Nossa senhora das flores”, de Jean Genet; “A geração Trianon”, de Anamaria Nunes; “Perigo de vida”, de Regina Miranda; “O rei Arthur e os cavaleiros da távola redonda”, de Celso Lemos; “A cada vez que se conta dele”, de Bruno Lara Resende; “O jovem Torless”, de Robert Musil, entre outras.


          Em 1988, recebeu indicação para o Prêmio MINC Troféu Mambembe como melhor ator por sua atuação em “João e Maria”, de Anamaria Nunes.


          Desde 1988 dá aulas de teatro na Casa de Cultura Laura Alvim.


          Desde 1992 dirige a Cia Atores de Laura.


          Em 2000 a Cia de Teatro Atores de Laura foi convidada para administrar o Teatro Miguel Falabella.


          Prêmios e indicações para prêmios:


1988 - Recebeu indicação para o Prêmio MINC Troféu Mambembe de melhor ator


1995 -Indicado para o Prêmio Coca-Cola de Teatro Jovem na categoria melhor texto e de melhor direção. Espetáculo “Cartão de embarque”.


1996 – Prêmio Coca-Cola de Teatro Jovem na categoria melhor direção Espetáculo “Romeu e Isolda”.


1997 – Prêmio Coca-Cola de Teatro Jovem nas categorias de melhor direção, melhor texto e melhor espetáculo – “Decote”.


1997 – Prêmio de melhor direção no IV Festival de Teatro de Resende.


2000 – Indicado para o Prêmio Coca-Cola de Teatro na categoria de melhor direção. Espetáculo “A flauta mágica”.


2000 – Prêmio Coca-Cola de Teatro nas categorias melhor espetáculo infantil e melhor produção.


2002 – Prêmio Qualidade BR de melhor direção e de melhor espetáculo.


2002 – Indicado no Prêmio Shell de melhor direção.


2011 – Indicado no Prêmio Shell de melhor direção pelo espetáculo Adultério.


2012 – Ministra Residência no Teatro Poeira em conjunto com a Companhia Atores de Laura


2012 – Prêmio Orilaxé de melhor direção pelo espetáculo O filho eterno


Livros publicados:


A entrevista seguido de Cartão de embarque. Editora Relume-Dumará


Decote seguido de Romeu e Isolda. Editora Garamond



Programação completa da Mostra– Atores de Laura 20 anos:


O Filho Eterno (2011) – Terças e quartas às 21h (Classificação indicativa: 12 anos)


R$ 40,00


Vencedor dos Prêmios Shell nas categorias melhor ator (Charles Fricks) e categoria especial: direção de movimento (Marcia Rubin) e indicada para melhor iluminação (Aurélio de Simoni).


Vencedor do Prêmio APTR de melhor ator (Charles Fricks).


Vencedor do Prêmio Orilaxé de melhor direção para Daniel Herz.


          Cia Atores de Laura apresenta “O Filho Eterno”, que já encantou a muitos na forma literária, de Cristovão Tezza, e faturou cerca de oito prêmios literários nacionais e internacionais, ganha adaptação teatral de Bruno Lara Resende e traz à tona emoções inesperadas na versão teatral, proposta pela Cia Atores de Laura. “O Filho Eterno” mostra a luta diária de um homem, vivido por Charles Fricks, sob a direção de Daniel Herz, que precisa lidar com as decepções que um filho pode trazer, focando no desafio de nossas limitações, sem perder o olhar elegante. Frases de impacto e inesperadas dão o tom poético dessa trama, em que vem a tona muitas questões que pensamos, mas que jamais teríamos coragem de dizer em voz alta. A chegada do primeiro filho com síndrome de down é apenas uma das diversas reflexões que envolvem a paternidade e são abordadas nessa já premiada história.


Adultério (2011) – Sextas e sábados às 21h30m (Classificação indicativa: 14 anos)


R$ 40,00


Indicado ao Prêmio Shell de melhor direção (Daniel Herz)


Indicado ao Prêmio FITA de melhor direção, texto (Cia Atores de Laura) e espetáculo


          A realidade é ilusão ou a ilusão é a realidade? Compartilhar esta questão com o público é, sem dúvida, compartilhar também o desespero que o absurdo da existência nos proporciona. Num movimento contínuo e ininterrupto uma realidade se desdobra em outras sucessivamente, como num jogo de espelhos até o infinito, criando deste modo a sensação perturbadora de que o que aparenta ser, não é. A reflexão profunda, visceral e o humor sofisticado de Pirandello acerca da fragilidade das outras certezas, encontra no tema do adultério o pano de fundo para colocar na cena teatral o abismo das infinitas realidades. Os Atores de Laura voltam, depois de "Romeu e Isolda" e "Decote", a produzir um texto, uma criação coletiva, agora inspirados em Pirandello, em um exercício cênico só possível pela cumplicidade desenvolvida em tantos anos de afetos e cenas.


O Enxoval (2010) – Sábados às 19h (Classificação indicativa: Livre)


R$ 40,00


          A peça é inspirada em duas senhoras, moradoras de Sobragi (Minas Gerais), que a atriz Ana Paula Secco conheceu em 1995. Essa vivência foi transformada em teatro junto com a atriz Verônica Reis e o ator e diretor Luiz André Alvim numa história que fala sobre o tempo, a solidão, a amizade. A encenação é simples e estruturada no trabalho das duas atrizes, tendo como pano de fundo a relação clássica dos palhaços Branco e Augusto. O espetáculo expõe um dia na vida dessas duas senhoras, que moram juntas na sua casinha que também funciona como a única telefônica dessa cidade do interior. A rotina morosa vai revelando as fantasias, sonhos e expectativas dessas sensíveis personagens, porém a calma desse tempo tão particular no qual vivem é quebrada pela chegada de um jovem publicitário colocando em evidência as diferenças entre essas duas realidades.


          Bem-vindos à telefônica comunitária de Sobragi, ou se preferir, bem vindos à casa de Célia e Amélia. Segundo Daniel Herz, “o trabalho de composição das atrizes Verônica Reis e Ana Paula Secco é um momento iluminado do teatro”.


Decote (1996) – Domingos às 20h (Classificação indicativa: 14 anos)


R$ 40,00


Vencedor dos Prêmios Coca-Cola de Teatro Jovem – 1996 nas categorias: Melhor Texto (Cia Atores de Laura), Melhor Direção (Daniel Herz e Susanna Kruger) e Melhor Espetáculo


Vencedor do Prêmio Festival de Teatro de Resende (FESTER) – 1996, nas categorias: Melhor Texto (Cia Atores de Laura), Melhor Direção (Daniel e Susanna Kruger) e Melhor Espetáculo


Indicado ao Prêmio Coca-Cola de Teatro Jovem – 1996 na categoria Melhor Iluminação (Aurélio de Simoni)


Indicado ao Prêmio Fester nas categorias melhor ator (Charles Fricks), melhor atriz (Clara Linhart e Verônica Reis)


          Após intenso estudo sobre toda a obra de Nelson Rodrigues, a Cia. Atores de Laura, inspirada no universo peculiar deste dramaturgo tão carioca, escreveu o espetáculo “DECOTE”, texto inédito, criado coletivamente.


          O espetáculo todo se passa num mesmo dia. As cenas, independentes, são ligadas dramaturgicamente pela grande final de Fla X Flu que acontecerá neste dia. Em cada cena, alguém se prepara para o jogo, comenta sobre o trânsito em dia de final ou, como todo bom carioca, escala o time como um técnico de copa do mundo. Cheio de rupturas e quase coreográfico, o espetáculo enlaça o trágico e o grotesco com graça e humor, apresentando sempre desfechos surpreendentes em cada estória.


As artimanhas de Scapino (2002) – Quintas às 21h (Classificação indicativa: Livre)


R$ 40,00


Indicado ao Prêmio Shell em três categorias: melhor direção (Daniel Herz), melhor ator (Charles Fricks) e melhor figurino (Heloisa Frederico). Levou o último.


Indicado ao Prêmio Qualidade Brasil em quatro categorias: Melhor atriz comédia (Maíra Graber), melhor ator comédia (Charles Fricks), melhor direção comédia (Daniel Herz) e melhor espetáculo comédia, vencendo as duas últimas categorias.


          As artimanhas de Scapino é um dos maiores sucessos de público e crítica da companhia Atores de Laura . Este primeiro mergulho da Cia. num grande clássico do teatro mundial caracterizou-se por um profundo estudo de uma das técnicas mais tradicionais da arte do ator: a dos cômicos da Comedia dell'arte.


          O mergulho dos Atores de Laura na Comedia dell'arte produziu um espetáculo cenicamente esfuziante e alegre. A história é contada utilizando-se técnicas corporais extremamente apuradas: o público ri e se emociona com as estripulias dos personagens ao mesmo tempo em que se impressiona com os corpos elásticos, quase circenses, que os atores colocam em cena.


          Na ausência de seus respectivos pais, Otávio casa-se secretamente com Jacinta – uma jovem pobre com um passado misterioso – e Leandro apaixona-se por Zerbineta, uma cigana. Mas eis que os pais regressam antes do esperado com planos de casamento para seus filhos. Desesperados e precisando de dinheiro para manter o compromisso jurado às moças, os rapazes recorrem a Scapino, criado de Leandro, famoso por sua esperteza. Valendo-se de truques e artimanhas – além da ajuda de Silvestre, o medroso criado de Otávio – Scapino cria situações engenhosas e engraçadíssimas para tentar arrancar dos velhos avarentos o dinheiro necessário e fazer triunfar o amor e a juventude.


Casa de Cultura Laura Alvim – Avenida Vieira Souto, 176, Ipanema, Rio de Janeiro


Tel: 2332-2016


Fichas Técnicas:


O Filho Eterno:


Texto: Bruno Lara Resende – adaptação do livro “O filho eterno” de Cristovão Tezza


Direção: Daniel Herz


Elenco: Charles Fricks


Cenário: Aurora dos Campos


Figurino: Marcelo Pies


Iluminação: Aurélio de Simoni


Direção de Movimento: Marcia Rubin


Direção Musical: Lucas Marcier


Direção de Produção: Ana Lelis


Consultoria Psicanalítica: Evelyn Disitzer


Assistente de Direção: Clarissa Kahane


Fotos: Dalton Valério


Direção Artística da Cia Atores de Laura: Daniel Herz




Adultério:


Texto: Cia Atores de Laura


Direção: Daniel Herz


Elenco:


Ana Paula Secco


Anderson Mello


Leandro Castilho/ Luiz André Alvim


Marcio Fonseca


Paulo Hamilton


Verônica Reis


Cenário: Fernando Mello da Costa e Rostand Albuquerque


Figurino: Patricia Muniz


Iluminação: Aurélio de Simoni


Direção de movimento: Marcia Rubin


Direção musical: Lucas Marcier


Direção de produção: Ana Lelis


Assistente de direção: Clarissa Kahane


Assist. de figurino: Eve Rodrigues


Modelista: Lucia Lima


Pintura em tecido: Ana Paula Guinle


Consultoria psicanalítica: Evelyn Disitzer




O Enxoval:


Texto : Ana paula Secco, Verônica Reis e Luiz André Alvim


Direção: Luiz André Alvim


Elenco: Ana Paula Secco, Verônica Reis e Luiz André Alvim


Iluminação: Luiz André Alvim


Figurinos: Ana Paula Secco


Cenário: Ana Paula Secco e Luiz André Alvim


Trilha sonora: Luiz André Alvim


Programação visual: Ana Paula Secco


Diretora de Produção: Ana Lelis




Decote:


Texto: Cia Atores de Laura


Direção: Daniel Herz e Susanna Kruger


Elenco:


Ana Paula Secco


Anderson Mello


Charles Fricks


Luiz André Alvim


Márcio Fonseca


Vanessa Dantas


Verônica Reis


Atores convidados: Clarissa Kahane, Carol Santorino, Eduardo Landin, Gabriela Rosas, Juliana Didone e Thiago Mello


Iluminação: Aurélio de Simoni


Cenografia: Lídia Kosowski


Figurinos e programação visual: Ana Paula Secco


Gesto e movimento: Marina Salomon


Assist. de direção: Leandro Castilho


Trilha sonora: Susanna Kruger




As artimanhas de Scapino:


Texto: Molière


Tradução: Carlos Drumond de Andrade


Direção: Daniel Herz


Elenco:


Anderson Mello (Argante)


Charles Fricks (Scapino)


João Marcelo Pallottino (Otávio)


Leandro Castilho (Leandro)


Maira Graber e Verônica Reis (Zerbineta)


Márcio Fonseca (Silvestre)


Paulo Hamilton (Gerôncio)


Val Elias (Carlos/Nerina)


Vanessa Dantas (Jacinta)


Iluminação: Aurélio de Simoni


Orientação corporal: Marcia Rubin


Figurino: Heloisa Frederico (Prêmio Shell de Melhor Figurino)


Cenário e objetos: Ronald Teixeira


Trilha sonora: Carlos Cardoso


Programação visual: Anderson Mello e Rodrigo Azevedo


Assistência de direção: Maíra Graber






FICHA TÉCNICA DA MOSTRA ATORES DE LAURA 20 ANOS


Direção geral: Daniel Herz


Elenco: Cia. Atores de Laura


Ana Paula Secco


Anderson Mello


Charles Fricks


Leandro Castilho


Luiz André Alvim


Márcio Fonseca


Paulo Hamilton


Verônica Reis


Direção de produção: Ana Lelis


Assist. de produção: Carol Miranda e Isabel Pinheiro


Cenotécnico: Coréia


Assist. de cenotécnico: Francisco de Paula


Fotos: Dalton Valério


Coordenação financeira: Raquel Barbosa


Produção e realização: Atores de Laura


Informações para a imprensa:


MNiemeyer Assessoria de Comunicação


www.mniemeyer.com.br


(21) 2178-2101 / 2178-2112


Leandro Gomes leandro@mniemeyer.com.br / (21) 9628-7718


Andrea Pessôa: andrea@mniemeyer.com.br / (21) 7883-5834


































segunda-feira, 28 de maio de 2012

Teatro/CRÍTICA

"A volta ao lar"

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Obra-prima em excelente versão


Lionel Fischer


Um dos maiores dramaturgos ingleses do século XX, Harold Pinter (1930-2008) escreveu dentro de uma convenção próxima à do Teatro do Absurdo. Valendo-se sempre de magistrais diálogos, não raro Pinter cria um clima de angústia latente, graças à sensação de que um perigo ronda a cena. Seus principais temas são a solidão, o medo, a incerteza existencial e a brutalidade das relações humanas. É autor de uma obra vasta e diversificada, com destaque para "O quarto", "O monta-carga", "Festa de aniversário", Uma ligeira dor", "O inoportuno" e "A volta ao lar".

Esta última é a terceira empreitada da Cia. Teatro Esplendor, criada por Bruce Gomlevsky - as montagens anteriores foram "Festa em família" e "Cyrano de Bergerac". Em cartaz no Centro Cultural Correios, "A volta ao lar" chega à cena com direção de Bruce Gomlevsky e elenco formado pelo próprio Bruce, Tonico Pereira, Arieta Corrêa, Jaime Leibovitch, Sérgio Guizé e Gustavo Damasceno.

Por tratar-se de uma obra por demais conhecida, não julgo necessário reproduzir seu enredo. E tampouco ficar tecendo muitas conjecturas sobre um texto que já mereceu volumosos ensaios de alguns dos mais brilhantes críticos do planeta. Seja como for, não custa nada enfatizar aquilo que me parece mais essencial - dentre muitos outros aspectos essenciais - desta obra magnífica: a extraordinária capacidade do autor de falar da condição feminina, ao menos como se apresentava socialmente quando escreveu "A volta ao lar".

É possível que o autor não tenha pretendido somente criar uma personagem feminina tão deslumbrante quanto enigmática, como é o caso de Ruth, mas sim um arquétipo da feminilidade. Como uma espécie de ilha cercada de homens por todos os lados, Ruth desempenha várias funções, tais como a de mãe, esposa, amante, prostituta e criada. E se por um lado serve aos homens, por outro os domina, na medida em que se torna a referência de uma casa impregnada de múltiplos conflitos.

Estes, evidentemente, já existiam, pois quando a personagem surge o espectador já se familiarizou com os confrontos familiares, com a crueza da expressões, com os baixos instintos e com a intolerância generalizada. Mas certamente é através de Ruth que tais conflitos se potencializam e, magistral e ironicamente, como que se equacionam.

Através de uma escrita que mescla frieza, humor e brutalidade, Harold Pinter criou uma das peças mais brilhantes de sua obra, que recebeu aqui uma versão à altura de seus incontáveis méritos. Impondo à cena uma dinâmica que, desprezando inúteis mirabolâncias formais, prioriza o que de fato importa - a exposição crua dos conflitos entre os personagens - Bruce Gomlevski valoriza de forma admirável todos os conteúdos implícitos, valendo-se de marcas expressivas, ótima manipulação dos tempos rítmicos e de um irrepreensível trabalho de todo o elenco, a começar pelo próprio.

Na pele do suposto cafetão Lenny, Bruce materializa de forma irretocável uma personalidade marcada pelo cinismo, frieza e virulência. Vivendo o patriarca Max, Tonico Pereira exibe uma das melhores atuações de sua brilhantíssima carreira, conferindo ao personagem uma dimensão à altura de sua complexidade, tanto no que diz respeito ao texto articulado quanto à composição física. Sem dúvida, um dos desempenhos mais marcantes da atual temporada.

Como Ruth, Arieta Corrêa atende a todas as exigências do dificílimo papel, que pressupõe fortíssima sensualidade e uma ambigüidade exasperante, diria mesmo enigmática, num permanente jogo de submissão e domínio. Jaime Leibovitch também convence plenamente na pele do pacífico e enquadrado Sam, o mesmo aplicando-se a Gustavo Damasceno, que dá vida a Teddy, marido de Ruth, professor de filosofia que parece a perfeita encarnação do burguês acomodado e blasé. Em papel de menores oportunidades, ainda assim Sérgio Guizé valoriza muito bem o pugilista dotado de pouquíssimos neurônios.

Na equipe técnica, destaco com o mesmo entusiasmo as irrepreensíveis contribuições de todos os profissionais envolvidos nesta mais do que oportuna empreitada teatral - Luiz Paulo Nenen (iluminação), Bel Lobo (cenografia), Rita Murtinho (figurinos) e Millôr Fernandes, responsável por ótima tradução.

A VOLTA AO LAR - Texto de Harold Pinter. Direção de Bruce Gomlevsky. Com Bruce Gomlevsky, Tonico Pereira, Arieta Corrêa, Jaime Leibovitch, Sérgio Guizé e Gustavo Damasceno. Centro Cultural Correios. Quinta a domingo, 19h.

quarta-feira, 23 de maio de 2012

LEITURA DRAMATIZADA DO TEXTO “POLACA!”, DE RENATA MIZRAHI, DIA 31 DE MAIO, NO TEATRO SERRADOR



Orientação de dramaturgia e direção de Moacir Chaves


          Autora das peças infantis Joaquim e as estrelas e Francisco e o Mundo, Renata Mizrahi apresenta texto adulto e inédito. Polaca! terá leitura dramatizada no Teatro Serrador, quinta-feira, dia 31 de maio, às 21h. A orientação do texto e a direção da leitura são do diretor Moacir Chaves, com Ana Barroso, Diego Molina, Fernando Lopes Lima, Mônica Biel, Kassandra Speltri, Edson Zille e Gabriela Estevão no elenco.


          Um jantar judaico é o pano de fundo para a discussão de diversas questões, como o preconceito nos dias atuais, as relações familiares, os conflitos de gerações e opiniões. O resultado é um texto com boa dose de humor ácido e perturbador. O texto foi escrito após um longo processo de pesquisa da autora, que teve como tema as judias polacas no Rio de Janeiro. O projeto foi realizado com o patrocínio do Governo do Rio de Janeiro e da Secretaria de Estado de Cultura - Edital Apoio à Pesquisa e Criação Artística 2010.


          Sinopse: Uma noite, durante o jantar de uma família de origem judaica. Ao contar sobre sua nova pesquisa – as judias polacas no Rio de Janeiro –, a jovem Clara se surpreende com os preconceitos de sua avó, Esther, que não admite que esse tema seja discutido no jantar. Mas uma grande revelação durante a noite faz a avó repensar a postura que dominou toda sua vida.


          Sobre a autora: Renata Mizrahi é dramaturga e roteirista, formada em Artes Cênicas pela UNIRIO. Participou da Oficina de Autores da Rede Globo e integrou a equipe de TV da Conspiração Filmes. É fundadora da Companhia Teatro de Nós e escreve para www.dramadiario.com. Foi vencedora do Prêmio Zilka Salaberry 2010, na categoria Melhor Texto, pela peça Joaquim e as Estrelas. Ganhou a bolsa de dramaturgia da SEC RJ para escrever o projeto dramatúrgico Polaca! Foi finalista do concurso nacional de dramaturgia infantil Ana Maria Machado 2009 com “Joaquim e as Estrelas”, contemplado com patrocínio da Oi Futuro 2010.


          Escreveu também as peças Francisco e o Mundo, Cuide bem das Orquídeas, Rua dos Sonhadores, Nada que eu disser será suficiente até que o sol se ponha e 5 Atos. Em parceria com Julia Spadaccini, escreveu Um dia Anita e, com Fernando Caruso e César Amorim, Lar... Outros textos ainda inéditos de Renata são: Betty Davis e a Máquina de Coca-Cola (com Jô Bilac – estreia em agosto), Coisas que a gente não vê (estreia em outubro), Os sapos e O aviador.


SERVIÇO: Leitura dramatizada “Polaca!”


Local: Teatro Serrador


Endereço: Rua Senador Dantas, 13 - Cinelândia


Data: quinta-feira, dia 31 de maio de 2012


Horário: às 21h


ENTRADA FRANCA


Duração: 60 minutos


Classificação etária: 12 anos


Capacidade de público por sessão: 340 pessoas


Informações: (21) 2220-5033 (Teatro Serrador)











A essência do teatro

Anatol Rosenfeld


          O teatro, longe de ser apenas veículo da peça, instrumento a serviço do autor e da literatura, é uma arte de próprio direito, em função da qual é escrita a peça. Esta, em vez de servir-se do teatro, é ao contrário material dele. O teatro a incorpora como um dos seus elementos. O teatro, portanto, não é literatura, nem veículo dela.

          O texto, a peça, literatura enquanto meramente declamados, tornam-se teatro no momento em que são representados, no momento, portanto, em que os declamadores, através da metamorfose, se transformam em personagens. A base do teatro é a fusão do ator com a personagem, a identificação de um eu com outro eu - fato que marca a passagem de uma arte puramente temporal e auditiva (literatura) ao domínio de uma arte espaço-temporal ou audio-visual.

          O status da palavra modifica-se radicalmente. Na literatura são as palavras que medeiam o mundo imaginário. No teatro são os atores/personagens (seres imaginários) que medeiam a palavra. Na literatura a palavra é a fonte do homem (das personagens). No teatro o homem é a fonte da palavra.

          A essência do teatro é, portanto, o ator transformado em personagem. O texto é um bloco de pedra que será enformado pelo ator (diretor). O texto contém apenas virtualmente o que precisa ser atualizado e concretizado pela idéia e forma teatrais. A atualização é a encarnação, a passagem de palavras abstratas e descontínuas para a continuidade sensível, existencial, da presença humana.

          Ao encarnar o mundo apenas sugerido pelas palavras, ao preencher as lacunas deixadas pelos vocábulos, o ator (diretor) tem de fazer uma escolha radical entre mil possibilidades diversas. Nessa definição, individualização e concretização de conceitos universais, colaboram o diretor, o cenógrafo, o ator e o próprio público.

          É nesse trabalho que reside a responsabilidade criativa dos representantes do teatro: o texto apresenta apenas um sistema de coordenadas que deve ser preenchido pela música dos movimentos, pelas inflexões da voz, pelas mil nuanças indefiníveis da mímica e do gesto. Isso explica o fato de haver só um texto de Hamlet e centenas de Hamlets diversos. O texto deixa indeterminada uma infinidade de momentos. A grande flexibilidade do teatro vivo permite preencher os vãos e vácuos de mil maneiras, conforme a época, a nação, a concepção e o gesto.

          A metamorfose, fato fundamental do teatro, é simbolizada pela máscara. A máscara é o símbolo do disfarce. O deus grego da máscara é Dioniso, a cujo culto se atribui a origem do teatro grego. Um coro ritual entoava cantos ditirâmbicos e executava dança em homenagem ao deus da fertilidade, do vinho, da embriaguez e do entusiasmo. É no estado da exaltação, fusão e união mística, do entusiasmo, isto é, do "estar-em-deus" ou do "deus-estar-em-mim" - é neste estado de êxtase (do "estar-fora-de-si") que o crente se transforma em outro ser, se funde não só com os companheiros mas com o próprio deus chamado à presença pelo ritual. Esse êxtase ainda ocorre quando João da Silva ou Maria das Dores põem a máscara, se disfarçam e se transformam em Macbeth ou em Antígona.

          Mas esse disfarce é ao mesmo tempo uma revelação. João da Silva precisa encobrir, disfarçar a sua particularidade, seu papel civil ou social de cidadão brasileiro, para assumir o papel do herói, mercê do qual representa exemplarmente a condição humana, as vicissitudes trágicas ou cômicas da existência humana. O disfarce é uma revelação; é preciso encobrir João da Silva para que ele se identifique com Macbeth decifrando o mistério humano. Ao apagar-se o cidadão real, pela máscara, transparece a verdade mais profunda da ficção que adensa em Édipo ou Fedra.

          Todavia, não só o ator se identifica com Édipo. Também o público se funde com ele. Todos participam da metamorfose. Todos vivem intensamente a condição humana, nos seus aspectos trágicos ou cômicos. O grande espetáculo é, ainda hoje, uma celebração festiva. Esquecemos a nossa particularidade de comerciantes, pais, filhos; esquecemos a cotação do dólar e maldade dos concorrentes. Libertamo-nos da nossa condição particular para participar do destino exemplar dos heróis e para, transformados no outro, vivermos a essência da nossa condição.

          Evidentemente, a metamorfose não é real. É apenas simbólica. O processo é imaginário. Nenhum ator sente realmente as dores do martírio no palco. Se de fato as sentisse, estaríamos diante da realidade e não poderíamos permanecer calmamente nas poltronas. Tanto os atores como o público, no mais intenso êxtase de autoesquecimento, mantêm aberto um pequeno olho vigilante, reservando-se uma margem de lucidez e de distância.

          Se Dioniso é o deus da fusão e do abraço ébrio, Apolo é o deus da distância e da lucidez. O teatro grego, ao unir o canto e a dança, do coro ao diálogo dos atores, uniu o mundo telúrico-demoníaco de Dioniso ao mundo olímpico de Apolo. Nesse sentido, o teatro representa de um modo exemplar esse ser dúplice, completo de natureza e espírito, que é o ser humano.

          A partir daí revela-se um novo aspecto da metamorfose. Ela é, de certo modo, a origem do ser humano. O homem, de fato, só se torna homem graças à sua capacidade de separar-se de si mesmo e identificar-se com o outro. Essa faculdade é um dado básico da antropologia. O ator apenas executa de forma radical o que distingue o homem: desempenhar papéis no palco do mundo, na vida social. Como o hábito faz o monge, assim a máscara faz a persona. Não é sem razão que o termo grego para ator - hipocrites - assumiu o sentido que conhecemos.

          Para fundir-se com outro, preciso sair de mim, expandir-me além dos limites do próprio eu. Só assim, separado de mim mesmo, tornado-me objeto de mim, consigo definir-me como Ego e conquistar a autoconsciência. Só ao idenficar-me com outrem, conquisto minha própria identidade. O animal é maciçamente idêntico a si mesmo, não tem a capacidade do hipocrites de desempenhar papéis, de libertar-se de sua unidade natural, projetar-se além de si mesmo. É preciso desdobrar-se para conquistar um mundo imaginário, projetar-se além, tomar posse do reino espiritual.

          Essa duplicidade eleva o homem além de sua condição natural, através do espírito, da capacidade de expansão ilimitada. Mas, nem por isso, continua um ser natural, finito, limitado. Essa contradição entre a finitude da sua natureza e a expansividade infinita do espírito é a raiz tanto da tragédia como da comédia. Na tragédia participamos do naufrágio do herói, que, embora sendo finito, aspira ao infinito. Mas mesmo no fracasso revela-se a dignidade espiritual do homem. Sentimos exaltada a nossa condição humana na grandeza do herói, na sua liberdade, na sua vontade inquebrantável.

          Já a comédia ressalta a fragilidade humana. A dignidade é desmascarada. É revelada sua condição precária. Enquanto ser espiritual, o homem traça planos grandiosos; mas por isso mesmo não vê a realidade próxima e cai sobre uma casca de banana. A duplicidade humana é ao mesmo tempo trágica e cômica. Nela residem a grandeza e a fraqueza do homem.

          Vemos, pois, que o teatro é uma imagem do homem, não só ao representá-lo através de figuras particulares como Fedra, Otelo ou Woyzeck, mas também pela sua própria essência. A metamorfose, exemplarmente executada pelo ator, define o homem.
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Extraído de Prismas do Teatro, Editora Perspectiva

terça-feira, 22 de maio de 2012

Nelson Rodrigues inventou o óbvio

Arnaldo Jabor


          Os cem anos de Nelson Rodrigues estão sendo celebrados por muita gente que o criticou em vida e hoje o glorifica. Tanto as depreciações quanto alguns louvores são descabidos. Ele não era nem pornográfico nem um escritor aspirando à condição de estátua. Nelson adorava elogios, mas odiava os "medalhões".

          Nelson Rodrigues é importante como inventor de linguagem. A importância de sua obra está onde ela parece "não ter" importância. Onde ela é menos "profunda" - ali é que se encontra uma qualidade rara. Era fácil (e justo) considerar "gênios" homens como Guimarães Rosa ou Graciliano Ramos, mas Nelson nunca coube nos pressupostos canônicos. Sua obra é um armazém, um botequim geral, uma quitanda de Brasil.

          Formado nas delegacias sórdidas, vendo cadáveres de negros "plásticos e ornamentais", metido no cotidiano marrom do jornal do pai, Nelson flagrou verdades imortais que estavam ali, no meio da rua, na nossa cara, e que ninguém via.

          Uma vez ele me disse: "Se Deus perguntar para mim se eu fiz alguma coisa que preste na vida, eu responderei a Deus: 'Sim, Senhor, eu inventei o óbvio!'".

          Filho do jornalismo policial, Nelson desconstruía o pedantismo tão comum entre nossos escritores.

          Uma vez ele me disse ao telefone que o "problema da literatura nacional é que nenhum escritor sabe bater um escanteio": ensolarada imagem esportiva para definir literatos folgados. Até hoje, muita gente não entendeu que sua grandeza está justamente na observação dos delírios do cotidiano.

          A faxina que Nelson fez no teatro e depois na prosa é semelhante à que João Cabral fez na poesia. Nelson baniu as metáforas a pontapés "como ratazanas grávidas" e criou antimetáforas feitas de banalidades condensadas. "A poesia está nos fatos", como escreveu Oswald de Andrade no "Pau Brasil". Pois é, Nelson também odiava metáforas gosmentas. Sua iamegns não aspiravam ao "sublime". Exemplos:

"O torcedor rubro-negro sangra como um César apunhalado"

"A mulher dava gargalhadas de bruxa de disco infantil"

"Seu ódio era tanto que ele dava arrancos de cachorro atropelado"

"A bola seguia Didi com a fidelidade de uma cadelinha ao seu dono"

"O juiz correu como um cavalinho de carrossel"

"O sujeito vive roendo a própria solidão como uma rapadura"

"Somos uns Narcisos às avessas que cuspimos na própria imagem"

"Vivemos amarrados no pé da mesa bebendo água numa cuia de queijo palmira"

"Hoje o brasileiro é inibido até para chupar um chicabon".

          Visto por ele, tudo boiava no mistério: os ovos coloridos de botequim, as falas dos "barnabés", as moscas de velório no nariz do morto. Nelson fazia a vida brasileira ficar universal, não por grandes gestos, mas pelo minimalismo suburbano que ele praticava. E o sublime aparecia na empada, na sardinha frita ou no torcedor desdentado.

          Sua obra é um desfile de tipinhos anônimos, insignificantes - nisso aparecia sua grandeza desprezada. São prostitutas bondosas, cafajestes poéticos, canalhas reluzentes, vagabundos épicos, sobrenaturais de almeida, adúlteras heroicas e veados enforcados. Ele me dizia: "O que estraga a arte é a unidade".

          Ele dava lições de arte e literatura: "Enquanto o Fluminense foi perfeito, não fez gol nenhum. A partir do momento em que deixou de ser tão Flaubert, os gols começaram a jorrar aos borbotões, pois a obra-prima no futebol e na arte tem de ser imperfeita". Existe coisa mais "contemporânea"?

          Gilberto Freyre sacou sua "superficialidade profunda", assim como André Maurois entendeu que a genialidade de Proust era "a épica das irrelevâncias". E isso é muito saudável, num país onde ninguém escreve um bilhete sem buscar a eternidade.

          Nunca deixava a literatura prevalecer sobre a magia dos fatos. Sempre um detelhe inesperado caricaturava os dramas. No meio da tragédia, vinha a gíria; no suicídio - o guaraná com formicida; no assassinato - a navalhada no botequim; na viuvez - o egoísmo; nos enterros - a piada.

          Uma vez contou-me que viu uma família esperando num hospital a notícia sobre um filho atropelado. "Morreu ou não?", afligiam-se todos, vistos pelo Nelson através do vidro do corredor. Viu o médico chegar e dizer que o menino tinha morrido. "Eu vi pelo vidro. Não ouvi um som. A família começou a se contorcer em desespero. Pai, mãe, tios gritavam e, através do vidro, pareciam dançar. Pareciam dançar um mambo. Daí, eu concluí a verdade brutal: a grande dor dança mambo".
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Parte da crônica publicada em 22/05/2012 no jornal O Globo.


Teatro/CRÍTICA

"Uma noite na lua"

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Paixão e criação no Jockey


Lionel Fischer


Levada à cena em 1998, "Uma noite na lua" arrebatou público e crítica - Marco Nanini, em atuação deslumbrante, ganhou o prêmio de melhor ator do ano da APCA (Associação Paulista dos Críticos de Arte) e João Falcão levou o Shell de melhor autor, além do Sharp de melhor espetáculo. Agora, passados quase 15 anos, o texto ganha nova versão, em cartaz no Teatro do Jockey, assinada pelo mesmo autor/diretor e tendo como intérprete Gregório Duvivier, um dos mais talentosos atores de sua geração.

Embora ainda me recorde de várias passagens da montagem anterior, recusei-me a ler o que escrevi na época. E minha recusa se deve ao fato de que tenho plena consciência de que certas comparações não são nem um pouco salutares, pois ainda que o texto permaneça o mesmo, os atores não pertencem à mesma geração (quando Nanini fez a peça devia ter em torno de 50 anos, enquanto Gregório, ao que imagino, deve estar na casa dos 30), o momento atual é diferente daquele e, sobretudo, as dinâmicas cênicas são totalmente díspares.

Na montagem anterior, João Falcão criou uma encenação apoiada em um cenário grandioso e repleta de efeitos visuais, enquanto que esta dispensa toda e qualquer cenografia, sendo a iluminação o recurso expressivo predominante. Portanto, o que se segue tentará traduzir apenas e tão somente o que senti agora ao assistir "Uma noite na lua".

Estamos diante de um escritor/dramaturgo que ainda não teve uma linha publicada, tampouco uma peça encenada. Ele está sozinho em um palco e tenta pensar. Tenta escrever um texto teatral que deverá estar pronto no dia seguinte - pouco antes, numa festa, ele garantiu a um ator famoso que tinha uma peça que o agradaria. Mas não consegue iniciar e muito menos desenvolver o texto, já que acossado por constantes lembranças de Berenice, a mulher que o abandonara.

À medida que o tempo passa, algumas coisas vão ficando claras. Uma delas, talvez a principal, é a necessidade obsessiva do personagem de atender a supostas expectativas da mulher que o deixou, como se, no caso de atendê-las, pudesse reconquistá-la. Ou seja: está completamente preso ao passado, que é uma das principais características do neurótico. 

Ao mesmo tempo, recorda momentos felizes de seu casamento, algumas encantadoras miudezas do cotidiano que são, como todos sabemos, um dos pilares de qualquer relação - ao contrário do que sustentam românticos utópicos e desvairados, que acreditam que um relacionamento amoroso só possa existir desde que pontilhado, com o máximo de freqüência, por arroubos operísticos de paixão.

E também está em causa um tema vital: o da criação artística. Como criar? Por quê criar? Para quem criar? Como se chega ao sucesso? Este é realmente necessário? E as horas vão passando e o personagem não consegue materializar coisa alguma, o que me faz pensar que esta não-materialização talvez seja o tema central do texto.

Para tais perguntas, naturalmente, cada espectador encontrará sua resposta. A minha é que João Falcão produziu um texto de altíssima relevância, impregnado de humor, poesia, solidão e dilaceramento, e cuja atualidade permanece inalterada. Quanto à encenação, ainda que considerando-a original e instigante, me permito algumas ressalvas. A principal delas diz respeito àquilo que imagino que o encenador considera um de seus principais trunfos: a iluminação.

Ainda que belíssima, a luz de Cesar Ramires me deu sempre a sensação de não existir enquanto recurso expressivo capaz de enfatizar os múltiplos climas emocionais em jogo, mas de praticamente determiná-los, o que é completamente diferente. Um exemplo: num dado momento, o personagem manipula uma bola de tênis imaginária; um foco se fecha sobre sua mão, o personagem atira a bolinha para o alto, o foco some, depois retorna etc.

O efeito é interessante? Sem dúvida interessantíssimo. Mas será que esta passagem ficaria pior na inexistência do tal foco e do dito efeito? Seriam realmente necessárias tantas alterações de luz ao longo de toda a montagem? E mais: tive sempre a sensação de que essa aposta neste mar de efeitos traduziria não necessariamente - ou exclusivamente - uma proposta estética, mas um desejo de, digamos, conferir uma versão mais contemporânea ao texto. Sei que disse acima que a montagem anterior exibia muitos efeitos visuais; ocorre que os mesmos, se bem me lembro, estavam intrinsicamente ligados ao contexto, soavam reais em sua irrealidade, ao passo que agora me pareceram excessivos, um tanto forçados - mas trata-se apenas de uma opinião e, como tal, sujeita a todos os enganos. 

Efeitos luminísticos à parte, é inegável que João Falcão extrai de Gregório Duvivier uma atuação com muitos méritos, sendo o maior deles a capacidade do ator de materializar, com absoluta sinceridade, sua dependência e amor pela mulher que o largara, assim como sua fragilidade. Ainda assim, acredito que certas passagens poderiam ser trabalhadas com maior tragicidade, como aquela em que o personagem, vestido inadequadamente, é alvo de comentários desabonadores na festa em que oferece seu texto ao ator.

Em minha opinião, esta passagem é dilacerante, aterradora, e da forma como está realizada senti apenas uma certa pena do personagem, quando o normal seria que carpisse como uma lavadeira grega - tudo bem, cada um sente como pode, e não estou pretendendo insinuar que a única reação válida seria aquela que imaginei que teria. Mas acredito que o trágico e o poético, que me parecem ser dois componentes fundamentais deste ótimo texto, não atingiram aqui sua máxima dimensão.

Com relação ao restante da equipe técnica, considero de ótimo nível a direção musical de Dani Black e Maycon Ananias, cabendo também destacar a excelente preparação corporal a cargo de Gilvan Gomes.

UMA NOITE NA LUA - Texto e direção de João Falcão. Com Gregório Duvivier. Teatro do Jockey. Sexta a domingo, 21h.