segunda-feira, 26 de outubro de 2009

Causas ou fontes do riso

Henrique Oscar


As causas ou fontes do riso têm sido formuladas por estudiosos, críticos, filósofos e psicólogos, e embora seus esforços tenham levado a respostas contraditórias, podemos aproveitar algo de suas idéias. Allardyce Nicoll, em sua teoria do drama, apresenta três temas.

DERRISÃO - A observação de Aristóteles de que a comédia lida com "homens piores do que eles são", implica numa teoria cômica da derrisão ou da degradação. A comédia grega ridicularizou deformidades físicas e de conduta. A teoria cômica da derrisão é especialmente verificada quando o autor traça idéias e personagens satiricamente. Embora a degradação física, os personagens excêntricos e a linguagem insultuosa limitem-se praticamente à farsa, o autor satírico, atacando idéias, recorre igualmente ao ridículo. Aristófanes, Molière e Ben Jonson a ela recorreram.

INCONGRUÊNCIA - É a segunda teoria da origem da comicidade, segundo Nicoll. Talvez por ser a mais elástica e extensiva teoria da comédia, a idéia da incongruência é a mais ampla explicação da matéria. A incongruência resulta da tensão ou dissonância determinada pela justaposição de dois objetos ou personagens que expressem um contraste risível, como uma mulher gorda e grande casada com um homem magro e pequeno, ou uma pessoa deslocada no seu ambiente, como alguém de roupa de banho no teatro ou de traje a rigor na praia. O contraste usualmente depende do estabelecimento de um tipo de regra cuja desobediência é realçada.

A incongruência pode tomar várias formas: pode ser de situação, de personagens, de diálogo. A situação cômica baseada na incongruência apresenta um contraste entre o comportamento usual ou aceito e um desusado ou inaceitável. A incongruência de personagens envolve um choque entre o ideal e o real ou entre a aparência e a realidade.

A incongruência da linguagem ocorre quando o diálogo está em violento contraste com o seu contexto social, como, por exemplo, o emprego de uma interjeição numa conversação polida ou quando as palavras ditas causam o efeito oposto àquele desejado pelo personagem. Outra forma de incongruência na linguagem é quando ocorre uma maneira de falar que não combina com o personagem, como, por exemplo, refinados epigramas na boca de rústicos ou afirmações sábias feitas por crianças.

AUTOMATISMO - É a terceira fonte de riso, ainda segundo Nicoll. Uma das mais ricas e frutíferas teorias sobre o cômico é a de Bergson, quando afirma que a essência do risível é o automatismo. "Algo mecânico está incrustrado na vida. O homem se torna um objeto de riso quando se torna rígido e parece uma máquina ou perde o controle de si mesmo ou rompe o contato com a humanidade".

O automatismo do personagem ocorre quando ele perde sua flexibilidade humana e seu comportamento se torna mecânico na sua repetição, ou quando ele se torna um boneco sem controle de suas ações. O automatismo de situação é frequentemente baseado em repetições. Os pesonagens são apanhados pelas garras das circunstâncias e submetidos a uma dominação mecânica. Chaplin fez muito uso deste recurso.

Na comédia Dr. Knock, de Jules Romains, um charlatão repete exames e diagnósticos sempre idênticos. O automatismo do diálogo adquire formas diversas. Bergson fala em fazer ou dizer inadvertidamente o que não se tem intenção de dizer ou fazer. Ou então na repetição de uma frase, insistentemente, como em A cantora careca, de Ionesco: "Isto é curioso, como é bizarro, que coincidência", repetido inúmeras vezes.

Em resumo: uma comédia pode ao mesmo tempo lançar mão da derrisão, da incongruência e do automatismo.
__________________________
Este artigo, aqui resumido, consta da revista Cadernos de Teatro nº 140/1995.

Nenhum comentário:

Postar um comentário