segunda-feira, 16 de março de 2009

Teatro/CRÍTICA

"Hamlet"
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Ritmo vertiginoso minimiza bela montagem
Lionel Fischer
Da mesma forma que é praticamente impossível usufruir frutos positivos de uma discussão envolvendo política, religião ou futebol, o mesmo ocorre quando se tenta chegar a um consenso diante de uma montagem de um grande clássico, em especial do maior deles: "Hamlet". E isto ocorre por vários fatores, sendo o mais comum a insistência de "especialistas" ou de pessoas de razoável cultura de elegerem uma versão desta obra-prima como a definitiva, negando a outras eventuais méritos que possuam - e apenas por que entram em choque com o "modelo" que escolheram como perfeito e irretocável.
No presente caso, estamos diante de mais uma versão de "Hamlet", de Shakespeare, que todos consideram - inclusive os "especialistas" - como a melhor peça já escrita. Em cartaz no Oi Casa Grande, o espetáculo leva a assinatura de Aderbal-Freire-Filho e tem elenco formado por Wagner Moura (Hamlet), Georgiana Góes (Ofélia), Tonico Pereira (rei Claudio), Carla Ribas (rainha Gertrudes), Fábio Lago (Laertes), Gilray Coutinho (Polônio), Candido Damm (Guildestern, Marcelo, Fantasma, ator Luciano, Marinheiro e primeiro Coveiro), Marcelo Flores (Rosencranz, Fantasma, ator Rei, Marinheiro, Coveiro e Lorde), Mateus Solano (Horácio) e Felipe Koury (Bernardo, Fantasma, ator Rainha, Capitão, Mensageiro e Padre).
Como dissemos no parágrafo inicial, é impossível se montar "Hamlet" sem gerar controvérsias. Mas o que seria do teatro - e da vida - sem as ditas controvérsias, opiniões contraditórias, pródigos elogios ou ranger de dentes? Um tédio insuportável, uma monotonia que só pode agradar aos negam ao outro o legítimo direito de exercer sua singularidade.
Como todos sabemos, Aderbal Freire-Filho é um dos mais brilhantes encenadores deste país. Partindo desta premissa irrefutável, ele pode errar ou acertar, mas mesmo que erre mais do que acerte em um determinado espetáculo, ainda assim este certamente apresentará passagens de altíssimo nível, como ocorre nesta sua versão de "Hamlet" - e aqui cabe destacar, dentre outros momentos, aqueles em que os atores são filmados e suas imagens projetadas em um enorme telão; ou a passagem em que o protagonista, enquanto veste sua armadura, interpreta a si mesmo e a seu pai. E muitas outras poderiam ser citadas, mas nos abstemos de mencioná-las para não privar o espectador de belas surpresas.
Entretanto, acreditamos que o espetáculo seria mais atraente e impactante se o seu ritmo fosse um pouco menos vertiginoso, pois a velocidade com que os atores, de uma maneira geral, articulam o texto, nos impede de absorver as profundas e belíssimas reflexões que o fabuloso bardo faz sobre a natureza humana, em muitos de seus aspectos essenciais.
Com relação a Wagner Moura, a quem consideramos o melhor ator de sua geração, sua interpretação de Hamlet exibe momentos tocantes, nos quais torna-se evidente que o intérprete mergulhou de cabeça - e sem nehum pudor - no complexo universo do personagem. Trata-se de uma performance visceral, cabendo destacar o rico universo gestual criado pelo ator. No entanto, achamos que Moura poderia ter sido um pouco mais econômico no que concerne à sua atividade corporal, por vezes excessiva e meramente ilustrativa.
O restante do elenco, composto por excelentes profissionais, também mergulha de forma visceral no conturbado contexto criado por Shakespeare. Mas também acreditamos que o rendimento coletivo seria ainda melhor se a velocidade imposta à cena fosse um pouco menor, pois assim o texto chegaria até o espectador com maiores nuances e sutilezas, o que também permitiria um maior aprofundamento nas relações entre os personagens.
No que diz respeito à equipe técnica, Fernando Mello da Costa e Rostand Albuquerque assinam uma cenografia despojada e expressiva, cujo maior mérito talvez seja o de deixar claro que tudo se passa em um espaço teatral, que estamos diante de um jogo em que a imaginação e o lúdico são mais importantes do que uma cenografia descritiva e convencional. Marcelo Pies responde por figurinos pouco expressivos, sendo de ótimo nível a iluminação de Maneco Quinderé, a música de Rodrigo Amarante e a tradução de Aderbal, Moura e Barbara Harrington.
HAMLET - Texto de Shakespeare - Direção de Aderbal Freire-Filho. Com Wagner Moura, Carla Ribas e grande elenco. Oi Casa Grande. Sexta e sábado, 20h30. Domingo, 19h30.

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